O Estado de São Paulo – Caderno 2
6 de fevereiro de 2017

por Vanessa Barbara

No livro O Paradoxo da Escolha, de 2004, o psicólogo americano Barry Schwartz afirma que a oferta crescente de escolhas no mundo moderno pode ser paralisante, e não exatamente libertadora. Por exemplo: quando você se depara com 115 tipos diferentes de geleia no supermercado e acaba não levando nenhuma porque precisaria pesquisar melhor; ou quando você não sabe se escolhe um formato diferente de armação dos óculos, se compra lentes de contato ou se faz cirurgia corretiva.

Schwartz divide o mundo entre maximizadores (os que buscam incessantemente a melhor opção possível, mesmo quando se trata de geleias) e satisfazedores (que procuram uma opção que lhes pareça suficientemente satisfatória baseado em poucos critérios, e quando a encontram param de procurar). É claro que os mais felizes são os satisfazedores, mas muitos de nós (não vou apontar dedos) continuamos buscando no Google o resultado de testes cegos com vários tipos de geleia, ou se o espessante goma xantana faz bem, ou se por esse preço eu não deveria comprar uma compota. Enquanto você se martiriza sobre quais desses modelos de geleia irá fazer sua família mais feliz, você realmente garante que, não importa qual a escolha final, haverá arrependimento envolvido.

O melhor método seria simplesmente estabelecer um ou dois critérios essenciais – por exemplo: o preço até 20 reais e o fato de conter pedaços de frutas – e considerar-se satisfeito assim que encontrar o primeiro item que atenda a essas especificações. Pode não ser o melhor produto disponível para compra imediata nos supermercados do hemisfério ocidental, mas pelo menos a decisão foi rápida, você não fica se culpando e sobra tempo para de fato comer a geleia.

Outra ideia boa é estipular um limite de tempo máximo para tomar a decisão. E parar de se importar com a geleia dos outros.

Nas palavras de Schwartz, o segredo da felicidade é ter baixas expectativas.

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Agora imaginem que, antes de nascer, todos nós recebêssemos uma prancheta e tivéssemos que fazer uma série de escolhas quanto aos infortúnios patológicos que nos caberiam nesta vida.

Por exemplo: você escolheria nascer com miopia ou asma? Hérnia ou epilepsia? Em certos casos, vamos supor, entre mau hálito ou piolho, a escolha ainda por cima carregaria um forte estigma social. Mesmo caso com depressão e hipersonia. Aliás, você preferiria ter depressão ou ansiedade? Depressão ou pedra no rim? Depressão ou diabetes? Depressão ou beribéri?

Entre hipertensão e sarna, eu escolheria sarna – só não me peça para justificar. Eu talvez tentaria trocar ansiedade por doença celíaca, gastrite e frieira – no mesmo pacote. Confesso que seria difícil decidir entre síndrome de Waterhouse-Fridrichsen, afasia de Wernicke e doença de Refsum, pois não faço ideia do que são essas doenças, mas eu certamente tentaria um acordo por fora envolvendo crises periódicas de rinite e várias verrugas. E fecharia com o hipotireoidismo antes que tentassem me arrumar um problema renal.

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Uma das características dos maximizadores é que eles chegam a sofrer inclusive com a ponderação de opções que não existem: eu, por exemplo, me arrependo demais de não ter nascido homem branco. Nem de ter estudado num colégio paulistano de elite, desses com pomar no pátio e aulas de natação. Acabaria exercendo uma profissão mais monetariamente digna como analista do mercado financeiro, gestor de patrimônio, CEO de multinacional ou deputado federal da bancada do agronegócio. Ter nascido na América do Sul também não ajudou em nada.

Daí nos resta tentar escolher a melhor geleia possível do plano das ideias e passar três horas selecionando um título para este texto.