O Estado de São Paulo – Caderno 2
1 de agosto de 2016

por Vanessa Barbara

Há um mês, publiquei um apanhado com os melhores comentários hostis dirigidos a esta cronista. Embora uma porção de leitores tenha escrito para oferecer um ombro amigo, houve aqueles que se sentiram subitamente inspirados e renovaram seus votos de repúdio, abastecendo a autora de material para mais uma crônica. (Suspeito inclusive que algumas das observações mais maldosas sejam só uma forma de colaborar.)

Muitos são criativos e possuem um estilo erudito de ofender. Um dos melhores, que acabou ficando fora do texto anterior, é um comentário a uma crônica sobre gripe: “Cara colunista, pior do que uma gripe é o tédio que emana de suas colunas”.

Outro falou em “borrachinhas”, um termo misterioso cujo significado desconheço, e redigiu um texto pós-moderno com vírgulas ousadas em locais revolucionários: “Então você é uma daquelas, de média qualificação que, submete-se a escrever ‘borrachinhas’ para o New York Times. Não é mesmo?? Filha. Aproveite o seu tempo e, contribua qualitativamente, com o seu trabalhinho. ok?”

Alguns se referiram a mim como “jornalista”, entre aspas. Outros pediram a minha demissão “para o bem do Brasil”. E há sempre alguém que chuta o balde, como aquele que cravou, a respeito de um texto sobre rolezinhos: “Vamos ver o dia que algum parente dessa ilustre jornalista for vítima desses vagabundos que infestam nossa cidade”.

O fluxo de impropérios só tem se multiplicado.

Por isso fui procurar como artistas e pensadores consagrados reagiam às críticas da turma. Aprendi que o filósofo David Hume jamais respondia a ninguém, e o mesmo fazia o escritor Truman Capote, que considerava a réplica uma forma de rebaixar-se. “É preciso endurecer-se contra as opiniões”, aconselha o autor de A Sangue Frio. Em seu diário, Susan Sontag concordou com a premissa: “Ler críticas bloqueia os dutos por onde se tem novas ideias: colesterol cultural”.

Aldous Huxley não só se abstinha de responder como não lia nada a seu respeito. Já Toni Morrison faz questão de acompanhar tudo.

Após admitir que se sentia péssimo ao ler apreciações negativas, Kurt Vonnegut disse que achava absurdas as pessoas que destilam ódio contra um romance. “É como alguém que veste uma armadura completa para atacar um sundae.”

Thomas Mann observou que nossa receptividade a elogios não tem nenhuma relação com nossa vulnerabilidade ao abuso rancoroso; não importa quão idiota seja esse abuso ou o quão motivado seja por rancores pessoais, ele nos atinge mais que os elogios. “Isso é muito tolo, já que os inimigos são companheiros inevitáveis de qualquer vida robusta, a própria prova de sua força.”

O cineasta Jean Cocteau foi além: disse que é preciso ouvir cuidadosamente às primeiras ressalvas ao nosso trabalho e notar qual foi o elemento que os críticos não aprovaram. “Pode ser a única coisa na sua obra que é original e que vale a pena.”