Ode ao ebook

Postado em: 15th julho 2013 por Vanessa Barbara em Blog da Cia. das Letras, Crônicas
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Blog da Companhia das Letras
15 de julho de 2013

Por Vanessa Barbara


 

Sou fã do cheiro dos livros, da maciez das lombadas, das manchas de café nas páginas, das dobras no alto das folhas e do volume físico que você pode morder, arremessar e brandir para matar baratas. Mas também sou entusiasta do livro eletrônico.

Quando ganhei um e-reader de presente no ano passado (um Kindle, da Amazon), agradeci polidamente e julguei que nunca iria usá-lo, como se fosse uma incômoda pipoqueira ou uma panela elétrica de fazer arroz.

O primeiro livro eletrônico que comprei foi a biografia do Steve Jobs, por motivos puramente práticos: faltavam menos de 100 páginas para terminá-lo e eu não queria ter que levar para a França um livro de 935 gramas. Rasgar os últimos capítulos não me parecia uma opção adequada. Então decidi concluir a leitura no aparelho.

Naquela temporada, que se estendeu por cinco meses, fui mandando de volta para casa todos os livros já lidos e fiquei com apenas um: aquela engenhoca acinzentada, sem cheiro nem peso, mas que podia conter as obras completas de todos os romancistas deprimidos, poetas suicidas e jornalistas bêbados que eu desejasse.

Foi assim que os acionistas da Amazon.com.br tiveram o melhor Natal de todos os tempos: sim, a culpa foi minha. Passei a comprar compulsivamente os últimos lançamentos em literatura estrangeira, as obras de referência em luto, os manuais práticos para cuidar de quelônios e tudo o que me parecia remotamente interessante (ou barato demais para ser dispensado). Tive acesso a livros que demorariam meses para chegar ao Brasil, a preços razoáveis. Passei a ler três vezes mais do que antes, sobretudo no ônibus, onde é sempre penoso portar volumes pesados. Comprei por engano um título sobre o desenvolvimento macroeconômico dos tigres asiáticos (maldito “Compre agora com 1-Clique”) e fui prontamente reembolsada.

Meses atrás, antes de passar 28 horas no avião, fui às compras e empilhei treze novos títulos na minha biblioteca portátil, diversificando os gêneros: de romances duvidosos a thrillers da moda, passando por tratados sobre a psicologia da rejeição, clássicos da literatura, guias de Hong Kong e contos completos do Conan Doyle. Fui alternando as leituras conforme meu estado de espírito, e na volta precisei comprar mais.

O Kindle básico custa R$299, possui capacidade para até 1400 livros, pesa 170 gramas e sua bateria aguenta 15 horas de leitura ininterrupta. O Kobo custa R$ 259, armazena até 1000 livros e sua bateria dura até um mês. Para quem passa muito tempo no transporte coletivo, é um item de extrema necessidade. É bom também para desdenhar das revistas ruins nas salas de espera dos consultórios médicos.

A oferta de livros em português ainda é muito baixa e os preços não são tão convidativos quanto poderiam, mas este cenário está mudando.

Para quem adora destacar trechos das obras que lê (www.hortifruti.org), os leitores de livros eletrônicos são bem práticos e agrupam todas as marcas num só arquivo, com a nota bibliográfica pertinente (título, autor, página).

Desde que aderi ao leitor de e-books, melhorei da lordose típica de quem carrega livros pesados. Minha mala de viagens também ficou mais leve, embora eu ainda insista em empacotar, junto com a escova de dentes, alguns tomos antigos de valor sentimental ou que não possuem versão eletrônica. (Confesso: a mala para esta Flip não continha um só livro “de verdade” e voltei com apenas dois, o que deve ser uma espécie de recorde às avessas. Por outro lado, a lista de futuras compras eletrônicas só aumenta.)

E a geringonça é discreta: você pode ler as coisas mais vergonhosas sem que ninguém o identifique como fã de Dashiel Hammett, de Agatha Christie ou de livros de zumbis do espaço.

 

* * * * *

Vanessa Barbara nasceu em 1982, é jornalista e escritora. É autora da graphic novel A máquina de Goldberg (Quadrinhos na Cia., 2012, em parceria com Fido Nesti), O livro amarelo do terminal (Cosac Naify, 2008, Prêmio Jabuti de Reportagem), O verão do Chibo(Alfaguara, 2008, em parceria com Emilio Fraia) e do infantil Endrigo, o escavador de umbigo (Ed. 34, 2011). É tradutora e preparadora da Companhia das Letras, cronista daFolha de S.Paulo e colaboradora da revista piauí. Ela contribui para o blog com uma coluna mensal.
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