Folha de S.Paulo – Ilustrada
25 de fevereiro de 2013

por Vanessa Barbara

Sabe-se que a televisão é boa companhia. Há quem more sozinho e ligue o aparelho todos os dias, ao voltar para casa, apenas para se sentir menos solitário. Outros, mesmo com amigos na sala, não conseguem deixar de prestar atenção na tela, interrompendo conversas só para ouvir melhor.

Em 2004, um psicólogo comportamental da Universidade da Califórnia  descobriu que os depressivos podem se beneficiar com uma boa dieta de rostos televisivos pela manhã. Segundo Seth Roberts, os rostos precisam ter tamanhos reais e estarem à distância de uma conversação normal.

É como se a tevê fosse uma substituta do contato com as pessoas e conferisse ao espectador benefícios para o humor similares aos da socialização tradicional.

Nesse sentido, há uma categoria de espectadores ainda pouco estudada, mas digna de nota: a do cara que conversa com a tevê. Levando ao extremo sua cotidiana interação com os pixels, ele responde às angústias da figura na tela, censura duramente as piadas, discute, discorda, agride. Socializa, enfim, com sua Telefunken.

A relação que se tem com a telinha vai da personalidade de cada um.

Eu, de minha parte, costumo ceder a apartes jocosos. “Não diga!”, é o comentário diante de uma afirmação óbvia da apresentadora do telejornal, que garante que houve muita tristeza num funeral ou que o melhor jeito de poupar é não gastando.

Gosto de adivinhar o gracejo final das reportagens (tenho grande talento nessa área) e inventar chamadas mais interessantes: “No próximo bloco: como saber se seu hamster está possuído? E mais: os gols da rodada”.

Há quem responda às perguntas dos shows de prêmios, decifre charadas, dê boa noite ao âncora e não se contenha ao ser instigado num programa infantil. (Outro dia, o Agente Urso me perguntou onde estava a bola azul do nenê e eu respondi: “Não sei! Não sei! É muita pressão”.)

Também faço questão de avisar o mocinho que o bandido está vindo por trás com uma foice. Em filmes, aliás, sou do tipo participativa: me espanto com as atitudes do protagonista, antecipo acontecimentos e ofendo o elenco inteiro pela péssima atuação.

Conheci uma vez alguém que, entediado, gostava de inserir dublagens e diálogos inventados por cima das novelas – não me lembro quem era, mas sei que a temática aludia a pastéis.

E que as versões ficavam melhores do que os originais.