A Hortaliça

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Versailles está de parabéns
Edição #075, de 20 de outubro de 2008
Patrocínio: Café e Cachaçaria Boi na Brasa - Temos Pizza
hortalica@gmail.com
Edição extra de casamento

"Repara no amarelo, é lindo"
(John dos Passos, 1919)

 

EDITORIAL
Pela primeira vez em vinte e seis anos, A Hortaliça muda de logradouro: da saudosa Praça Tito, berço de tantas glórias e dores de barriga, passamos para a rua Piauí, onde foi fundado há dois meses um protetorado do Mandaqui. Neste endereço, há um oficial de Relações Exteriores (André Ponciano Conti, contratado mediante concurso) e uma área de jurisdição exclusiva dos conterrâneos mandacolenses. Aqui, o nobre nativo não poderá ser preso e tem o direito de invocar a Quinta Emenda a propósito de qualquer coisa. Aqui, não se pode conversar sobre o Salão do Automóvel e a única propina possível contém duas xícaras de farinha, uma de óleo, chocolate a gosto e leite fervente. Aqui, acolhem-se os irlandeses de cara gorda e rosada que desejam começar uma briga de socos. Aqui, acolhem-se os velhos da Mouffetard que desejam sair dançando ao som de melífluos sanfoneiros. Aqui, o adjetivo é liberado para uso irrestrito e há pato para o café. Nesta primeira edição enviada dos rincões d'além-Mandaqui, gostaríamos de cumprimentar nossos novos vizinhos (o bebê-diabo do 42, o homem que penteia a loira bizarra, o rock star decadente, o porteiro da família Soprano, a Stephanie e o Bigode) e dar um alô aos que ficaram nessa área de cavalos desgovernados que deixamos irreversivelmente pra trás. Gente, não atirem ovos que é feio.


:: REPARA NO AMARELO, É LINDO ::
John dos Passos, 1919

Randolph Bourne
surgiu como habitante deste planeta
sem o prazer de escolher pátria ou carreira
Era corcunda, neto de um padre congregado, nascido em 1996, em Bloomfield, New Jersey; foi aí que freqüentou a escola primária e o liceu.
Tirou o curso na Universidade de Colúmbia trabalhando numa fábrica de rolos para pianolas em Newark, corrigindo provas tipográficas, afinando pianos e atuando como acompanhador numa classe de canto no Carnegie Hall.
Em Colúmbia, estudou com John Dewey
ganhou uma bolsa que lhe permitiu ir a Inglaterra Paris Roma Berlim Copenhagen,
escreveu um livro sobre o sistema Gary.
Na Europa ouviu música, muitas obras de Wagner e Scriabine e comprou uma capa preta.
Este homenzinho semelhante a um pardal,
insignificância de carne torturada envolta numa capa preta,
sempre com dores e achaques,
colocou uma pedra na funda
e atingiu Golias em plena testa.
A guerra, escreveu, é a saúde do Estado.
Meio músico, meio especialista em teorias educacionais. A doença, a pobreza, o aleijão, a zanga com a família, não tinham roubado a Randolph Bourne o prazer de viver; era um homem feliz, gostava de Die Meistersinger, de tocar Bach com as longas mãos que se abriam com tanta facilidade sobre as teclas, de raparigas bonitas, de boa comida e de conversa ao serão. Quando estava a morrer de pneumonia, um amigo trouxe-lhe um eggnog. "Repara no amarelo, é lindo", dizia sem cessar enquanto a vida se apagava em delírio e febre. (Era um homem feliz.)


:: A BORBOLETA AMARELA ::

Titica nela.


:: O AVÔ NA MPB CONTEMPORÂNEA ::

Avô, meu grande avô
Não chegue na hora marcada
Assim como as canções
Como as paixões e as saladas

[...]

Nunca se esqueça nenhum segundo
Que eu tenho o avô maior que o mundo
Como é grande o meu avô por você


:: PORTARIA
Nº 494, 15 de julho de 1976 ::
Em A ditadura encurralada, de Elio Gaspari

O governo mandava tanto que o ministro da Agricultura ocupou duas páginas do Diário Oficial regulamentando a “padronização, classificação e comercialização interna” do pepino. Poderia ser “comum” ou “caipira”, longo, médio ou curto. Seu comprimento tinha de ser medido “no eixo que vai da base de inserção do pedúnculo ao ápice do fruto”. As caixas de comercialização deveriam ter 495 mm x230 mmx355 mm, não sendo permitida a mistura de pepinos comuns com caipiras. Quem quisesse embalar pepinos de forma diversa precisava requerer licença ao Ministério de Agricultura.


:: O MANUAL DOS INQUISIDORES ::
António Lobo Antunes

[...] no momento em que o escuro impedir de nos vermos um ao outro esqueça-me que eu faço a mesma coisa: do meu lado e pronto, assunto resolvido, continuo a tratar das hortaliças em sossego, continuo a envelhecer em sossego, já reparou no brilho dos legumes se anoitece, na cintilação do limoeiro, como tudo se torna nítido e claro antes das trevas, o contorno dos telhados, o contorno das janelas, a vibração de susto de água das cortinas, uma fissura microscópica da parede ou uma minúscula nódoa de grelado agora enormes e nas quais nunca tínhamos atentado, já reparou como os sons e as vozes mudam de cor, íntimos, vizinhos, inquietantes, como parece que habitamos uma redoma de silhuetas e de ecos, acontece-me levar o senhor ministro à quinta, em setembro, e sentir-me flutuar entre os cedros, suspenso de um arame invisível como os peneireiros e os milhafres sobre Serpa no verão, exatamente no mesmo sítio de manhã e no dia seguinte e no outro e no outro, os peneireiros e os milhafres que ainda lá devem estar como me sucede a mim permanecer em Palmela entre os canis e as rosas, com a respiração dos lobos da Alsácia contra a rede de ferro, mirando-me de pupilas conformadas e tristes, a dona Titina a chamar-me dos degraus com o espanador na mão, arranjando o carrapito com os dedos livres
- Não quer um prato de sopa Tomás?


:: CLASSIFICADOS ::
Subject: Colheita de Uvas na Nova Zelândia. Mínimo 15 vagas! Ótimos ganhos.
 
COLHEITA DA UVA
INÍCIO IMEDIATO
Faça um intercâmbio remunerado!
 
NÃO precisa EXPERIÊNCIA
NÃO precisa de INGLÊS
Apenas disposição e boa saúde para colher frutas!

"Estaremos precisando de no mínimo 15 pessoas para a época que mais se ganha bem aqui na Nova Zelândia."

Estas pessoas deverão chegar no fim de abril a maio.

A pessoa com a qual trabalho providenciará o visto de trabalho, o IRD (como um CPF aqui) e acomodação. Nesta época, uma pessoa lenta faz em média NZ 800,00 por semana, caso não falte o trabalho e trabalhe 8 horas por dia. Entretanto, caso se trabalhe mais, ganha-se mais. conheci pessoas que ja tiraram ate NZ 1.500,00 dolares por semana. mas para isso, tem que se trabalhar mesmo!!

Estou mandando as fotos que eu te prometi, em varios emails. Te mandarei tb da fazenda de Kiwi.

As fotos 64 e 65 são redes que são postas para a proteção das uvas para que os pássaros não as estraguem."
 
Interessou-se?
 
Ligue entre 9 e 12 horas e garanta a sua vaga!
 
11-3323-8206
Elis
 
INVESTIMENTO TOTAL
DE APENAS R$ 9000 (INCLUINDO SUA VERBA DE VIAGEM, NÃO É CUSTO!).
 
Veja as fotos da colheita da uva (anexos)


:: POEMA, QUANDO DA ENTREGA DE UM RELEASE ::
Reinaldo Moraes

at least released!
here's your release.
hope it'll please
or else i'll freeze
- jeez!


:: A GRANDE IMPRENSA ::

15h05 Morre ator André Valli, o Visconde de Sabugosa
13h10 Erramos: Morre ator André Valli, o eterno Visconde de Sabugosa
12h46 Morre ator André Valli, o Visconde de Sabugosa


:: E MAIS ::

Festa de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim-2008 durou mais de quatro anos e apresentou ao mundo a história e a tecnologia chinesa


:: PROPAGANDA DE CHOCOLATE, 1895 ::
Cultura e Modernidade, Renato Ortiz

O chocolate fortificante de alcatrão do doutor Ramognino é o alimento mais salutar para se manter a saúde e para reparar a perda das forças das pessoas anêmicas. As mulheres, as moças, as crianças, os velhos linfáticos e convalescentes, que dele farão uso no almoço, provando-o, irão perceber rapidamente os resultados que se obtém, pois, ao comerem esses chocolates, os vapores de alcatrão vão diretamente para os brônquios e os pulmões, espalhando sua ação benfeitora entre as mucosas. Aqueles que detestam o óleo de fígado de bacalhau, os vinhos de quinino, o ferro, as cápsulas, as pastilhas, encontrarão uma vantagem em tomar o chocolate fortificante de alcatrão, cujo gosto agrada a todo mundo.


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Galochas
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:: RÉQUIEM PARA UM ENTREVÍRGULAS ::
de Bruno Brasil, que ganhou um conjunto de estofados

A afobação neurótica do caucasiano contemporâneo enquanto fator psicológico restrito ao status de ilusão de continuidade dos processos de prestígio social e estabilidade emocional que demarcam a especulação imediata de sucesso na carreira profissional do indivíduo que queira fazer jus à sua formação acadêmica e intelectual sem depender necessariamente de traços políticos ou ideológicos hoje menosprezados pela sociedade de consumo concomitantemente voltada a leis de mercado fundamentadas em uma base mundial capitalista que desconsidera fatores afetivos e processos de humanização ligados a empresas e demais instituições estritamente engajadas no bloco neoliberal que menos se importa com o bem-estar comunitário e talvez releve os benefícios do crescimento do poderio financeiro de populações antes relegadas a classes sociais excluídas ou em pleno processo emergente frente à engrenagem capitalista que obviamente possui postura estritamente contrária ao ideal de participação popular pregada pelos conceitos de coletividade desenvolvidos por bases intelectuais marxistas não necessariamente ligadas ao bolchevismo soviético obsoleto que ainda hoje é encontrado em algumas nações-estado que sofrem com suas instituições ineficientes e em frangalhos por cauda deste mesmo bolchevismo que impede o ingresso de tais governos à atual ordem financeira mundial de rigor inclusivo e globalizante tanto no sentido econômico quanto no sentido cultural em termos de troca de experiências que incluem ações de campos profissionais e de costumes que não venham a ferir os ideais mais fortemente pregados e difundidos pelo restante das nações participantes da atual ordem econômica e política interpessoal no qual se revela como ideal de vida ficar sentado o máximo de tempo possível em face ao momento contemporâneo que culturalmente prega que “correr para alcançar as portas do metrô antes que fechem constitui perigo para você e para os demais passantes” ou “não se deve brincar com o coração depois de uma certa idade” como noção de idade na existência econômica no aspecto prático da contemporaneidade torna-se nula ao profissional que não-raro pode já ter sofrido com inchaços (microtraumas) em partes tenras das mãos em decorrência de frenéticas contrações musculares ocasionadas pelo exercício do teclado do computador ou do telefone celular revelado como o “melhor amigo do homem moderno” que já dispensou o cão e a garrafa de whisky 12 anos e que a julgar pelo pensamento de teóricos ligados à importantes ramos da psicanálise não passa de um macaco histérico com uma câmera fotográfica digital à tiracolo, pode ser prejudicial a quem tem gastrite.


:: CARTA À REDAÇÃO ::


Olá, gostaria de sugerir para os próximos cartazes: Edgar mãos de cenoura, ele só pensa em cortar uma coisa: O Preço.
 
Sou Mariana Porto Barreto tenho 8 anos moro no rio de janeiro
em botafogo.
 
Beijos!


:: CLASSIFICADOS ::


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:: CARTA À REDAÇÃO 2 ::
Paula Cabral Gomes

Sou de aquário e amo groselha. Um descafeinado, por favor!


:: CARTA À REDAÇÃO 3 ::
Carlão Pacheco, Brasil

Qualquer coisa menos Pudim?
Tá legal, então não vou escrever Pudim.
Mas eu bem que gostaria de saber porque
não é para escrever Pudim, embora eu já
tenha assegurado que não vou escrever Pudim,
é só mesmo pra saber porque que Pudim não pode.


:: NELSON RODRIGUES ::

E nenhuma coisa é mais emocionante, lírica e sublime, do que a banha humana. Quando vejo um Chico Bóia, com sua cordial barriga, eu concluo: - "Lá vai um bom!" Desconfio dos magros, dos elegantes, ao passo que os gordos de ambos os sexos e de qualquer idade dão-me uma idéia de bondade, e, mesmo, de santidade.


:: PRIMEIRO JOGO DO BRASIL NA COPA DE 38 ::
Veneno Remédio, de José Miguel Wisnik

O campo estava lamacento, e, segundo Glanville, a certa altura do segundo tempo Leônidas “atirou ostensivamente as suas chuteiras para o treinador”, decidindo jogar descalço — como se estivesse numa pelada —, no que foi obrigado pelo árbitro sueco a calçá-las imediatamente.


:: OS PAÍSES SUL-ASIÁTICOS NA MPB CONTEMPORÂNEA ::

Você não soube me amar
(antiga Birmânia!)
Você não soube me amar
(antiga Birmânia!)


:: A TODOS OS IRLANDESES BANGUELAS ::
Para cantar agitando os braços

Well Jimmy played harmonica in the pub where I was born
He played it from the night time to the peaceful early morn
He soothed the souls of psychos and the men who had the horn
And they all looked very happy in the morning

Now Jimmy didn't like his place in this world of ours
Where the elephant man broke strong men's necks
When he'd had too many Powers
Said "I'm sad to see the grieving of the people that I'm leaving"
And he took the road for God knows in the morning

We walked him to the station in the rain
We kissed him as we put him on the train
And we sang him a song of times long gone
Though we knew that we'd be seeing him again

(FAR AWAY) sad to say I must be on my way
So buy me beer and whiskey 'cause I'm going far away (FAR AWAY)
I'd like to think of me returning when I can
To the greatest little boozer and to Sally MacLennane


:: CARTA AO OMBUDSGOD ::
de Antonio "Legume" Prata

Caro ombudsGod, venho por meio desta manifestar meu desagrado com a maneira sobremaneira relapsa com que Vanessa Bárbara (aka Deus) vem tratando o projeto "sopa de letrinhas", por ela tão aventado quando de sua campanha.
Faça chegar a ela, por favor, que agora que ela é uma pessoa famosa e aparece na capa dos jornais, vai ficar cada vez mais difícil esconder as promessas de campanha.
Sem mais (nem menos)
um eleitor


:: RESPOSTA DO OMBUDSGOD ::
de André "Hortaliço" Conti

Prezado/a Nonono/a,

a Hortaliça's God's Enterprises agradece sua manifestação, e lembra, em tom de reprimenda, que fim levaram outros contestadores do divino. É gente como Galileu e Darwin, capazes de jogar no cesto de lixo da história um futuro promissor em troca de bravatas despropositadas e acusações mesquinhas e vis. O missivista se esquece dos muitos avanços conquistados por Deus desde Sua ascensão, há cerca de dois anos: de modo geral, o trânsito melhorou em Higienópolis e redondezas, e o preço do bolo e dos demais derivados do chocolate na região caiu consideravelmente. Outros avanços: a transformação do Mandaqui numa descontraída cidade-estado, à maneira do Vaticano; a instauração de um ombudsgod que atenda à demanda da sociedade por um ombudsgod; o novo fusca; crediário simplificado e uma porção de coisas, puxa vida. No que tange a promessas de campanha, ora, queria o senhor missivista então que Deus fosse duas (Deus me livre!), e que Ela deixasse de lado, para atendar a uma demanda nada urgente, a igualmente aventada Semana do Hortifrutigranjeiro, o Dia Nacional da Gaita de Foles e outras efemérides de semelhante porte. É preciso, nesse primeiro momento, atuar em áreas onde a última administração -- arram -- "pecou", e portanto urge remendarmos antes de tudo a questão dos feriados religiosos; Deus detesta a Páscoa e condenou a alma de Papai Noel ao inferno nos primeiros dias de administração.

Cabe ao senhor missivista, portanto, aguardar de colherinha na praia; ao som das sete trombetas o seu mar alfabético, um dia, chegará.

Adverbialmente,
Departamento Jurídico e de Questões Teológicas Pendentes


COLABORAÇÕES

Do meu pai, do meu irmão, de Reinaldo Moraes, Adriano Bastos, Tiago Mesquita, Bruno Brasil, Antonio Prata e do barbante André Conti. Na próxima edição, Diário Olímpico, e mais: de como teremos que nos mudar para a vila Nova Conceição por causa da ameaça dos vizinhos.

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"Para ser lido na maldita hora da noite em que tudo é engraçado -- logo após a hora em que nada faz sentido e antes daquela em que tudo faz sentido" (Stephanie Avari, a ex-moradora mais ilustre da rua Paulo da Silva Gordo)  

## Você está recebendo !!Witzelsucht!! porque estava na mala direta. Ou então, ou então! Você está recebendo o !Rododendro! porque foi um dos 139 mil nomes escolhidos entre todos os possíveis, sorteados em uma grande urna chinesa. Você e o To Fu, que ganhou o direito de trazer um tufo de nenúfares e furar a fila. Caso não queira voltar a receber este jornalzinho, mande um e-mail para hortalica@gmail.com e diga na linha de assunto: "Foi demais para Kudno Mojesic", mesmo que você não seja -- e nem queira ser -- Kudno Mojesic.

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Por favor, parem de massacrar o inglês.


God is coming.
Look busy.



2005 Vanessa Barbara