Saúde pra dar e vender

Postado em: 1st janeiro 2013 por Vanessa Barbara em Crônicas, Folha de S. Paulo, TV
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Folha de S.Paulo – Ilustrada

31 de dezembro de 2012

por Vanessa Barbara

Roteiro automático para os telejornais de hoje: começamos com a apresentadora entre empolgada e surpresa, entoando: “Já é Ano Novo na Austrália”. Surgem imagens da Ópera de Sidney e do espetáculo de fogos de artifício.

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Depois de algumas frases sobre a comemoração nas ruas da Oceania e flashes de nativos espocando champanhe, entra uma matéria sobre a Corrida de São Silvestre e o cotidiano de treinos de um queniano na cidade. Direto do Parque do Ibirapuera, o repórter convence a pobre vítima a dizer: “Feliz Ano Novo” em português, o que faz a âncora sorrir.

Há uma notícia sobre calamidades climáticas em um país distante, que é prontamente equilibrada com uma matéria sobre como decorar sua mesa para o Réveillon.

Se o programa é no dia seguinte, lá se vão cenas do primeiro bebê do ano e as previsões de um vidente para 2013. “Alguém importante vai morrer”, ele garante. A apresentadora assume um ar sorumbático.

Outro clichê doloroso é o Show da Virada, na Globo, com a presença de bandas que você achava que não existiam desde a década de 90. Este ano, teremos Claudia Leitte, Zezé di Camargo & Luciano, Skank, Paula Fernandes, Aviões do Forró, Sorriso Maroto, Thiaguinho, Latino, Banda Eva, Chiclete Com Banana e Raça Negra.

Saber que o especial é gravado com um mês de antecedência (este ano foi em 27 de novembro) dá sentido àquela euforia excessiva e artificial. Todo mundo de branco, pulando e gritando, em comemoração a uma prosaica quinta-feira à noite.

O mesmo acontece antes da contagem regressiva: dá pra imaginar o produtor contando à distância e pedindo para repetirem porque o público não vibrou o suficiente, ou uma atriz estava com couve no dente. Vamos lá, é 2013 de novo: dez, nove, oito…

E todos entoam aquela canção desejando “muito dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender” – que, aliás, não faz sentido, pois não dá pra sair por aí doando ou comercializando vigor e robustez física, a menos que você esteja disposto a ceder um de seus rins.

Ontem, o “Fantástico” exibiu “imagens emocionantes” de brasileiros no momento em que receberam suas melhores notícias do ano, como a alta do hospital, a confirmação da gravidez ou a aprovação num novo emprego. 

Tudo minuciosamente fabricado para fazer o espectador se emocionar.

Ou o contrário: ele enfim se cansa das mesmas coisas, desliga a tevê e vai passar mais tempo com a família.