Folha de S.Paulo – Ilustrada
10 de setembro de 2012

por Vanessa Barbara

Há pouco menos de um mês, estive em Londres para cobrir os Jogos Olímpicos. Foram três semanas de velocistas extraordinários quebrando recordes, nadadores corpulentos planando na superfície da água, gigantes segurando bolas de vôlei como se fossem laranjas, gente saltando, voando, dando piruetas triplas e caindo no chão com os dois pés, sob os aplausos do estádio lotado.

Estaria mais à vontade se ficasse para assistir à Paraolimpíada, que acabou ontem e foi transmitida no Brasil pelo SporTV. Esta, sim, trata de pessoas comuns tentando lidar com imprevistos da vida, divididas em categorias tão imperfeitas quanto seus participantes.

A natação, por exemplo, separa os atletas em catorze níveis de função e movimento. O grau de deficiência vai de um a dez para limitações físicas e motoras; quanto maior o número, menor a limitação. Um nadador S10, portanto, tem poucas restrições.

A numeração de onze a treze indica deficiência visual e a catorze inclui atletas com deficiência intelectual.

Por mais que se procure ser justo no nivelamento, é impossível padronizar deficiências, o que torna a competição ainda mais plural e interessante, com nadadores anões competindo lado a lado com atletas amputados.

A largada é tão alternativa quanto possível: alguns saltam do bloco, outros pulam de barriga, outros já saem de dentro da piscina, as pernas agarradas pelo técnico. No nado costas, muitos não têm braço para segurar a borda da piscina, por isso, antes do tiro de largada, agarram com os dentes as toalhas estendidas pelos treinadores.

Uns não têm pernas e usam os braços, outros nadam num estilo meio lontra, como o chinês Tao Zheng, que não possui os dois braços e ganhou o ouro nos 100 m costas. Há técnicas ousadas de respiração, comemorações com o cotoco, nadadores de uma perna só e bastões para guiar os cegos. Houve um anão que entrou de motoca, todo pimpão, e um russo que agradeceu ao público em linguagem de sinais.

E como sorriem os atletas paraolímpicos – sorriem o tempo todo, aplaudindo a si mesmos.

Uma boa surpresa nessa cobertura é que o SporTV escalou um comentarista cego para os eventos de atletismo: Hilário Moreira Neto, que recebe a ajuda do guia Delton Leuri para explicar as provas.

“Com o perdão do trocadilho, assim a gente consegue ter uma visão melhor do que está acontecendo”, brincou Hilário.