Linguagem contida distingue seleção acima da média

Postado em: 16th julho 2012 por Vanessa Barbara em Clipping
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Figuras familiares, viagens e a presença do estrangeiro e ditaduras latinas são temas recorrentes na “Granta”

Folha de S.Paulo – Ilustrada
16 de julho de 2012

por Adriano Schartz

Logo no quarto texto da antologia da “Granta”, o conto “O Que Você Está Fazendo Aqui”, de Luisa Geisler, surge uma personagem chamada Meike (“As coxas dela se tocam quando ela fica em pé. Ela é linda. Nunca estaria na capa de nenhuma revista. É linda, loira, aqueles olhos verdes”).

Mais para o final do volume, em “Fragmento de um Romance”, de Carola Saavedra, o nome reaparece, quase igual, agora é Maike, a irmã perfeccionista da narradora da história.

Talvez estivesse aí um bom modo de escrever esta resenha difícil: apontar coincidências, pontos em comum entre os 20 “melhores jovens escritores brasileiros” selecionados pela revista.

TEMAS RECORRENTES

Mostrar como certas figuras e temas (o pai ou a mãe, a viagem e a presença do estrangeiro, as ditaduras latino-americanas) são recorrentes ou quase inexistentes (o sexo), ou discutir a dominância de narrativas em primeira pessoa, muitas delas de caráter semibiográfico.

Quem sabe constatar como tantos desses jovens estão ligados profissionalmente ao universo do texto (resenhistas, jornalistas, editores, muitos com mestrados ou doutorados em letras, não mais médicos, advogados ou funcionários públicos…).

Ou também especular qual imagem esse ente estranho para alguns, conhecido como “a literatura brasileira”, adquire aos olhos dos tantos leitores de outros países que terão contato com a antologia.

Talvez interessasse discutir também os critérios da seleção, recordar um ou outro nome ausente.

POUCO RISCO

Outro caminho seria afirmar que o nível médio dos 20 contos e trechos de romance é bastante bom, ainda que a contenção da linguagem seja uma marca mais presente do que o risco (a principal exceção aqui é a “Natureza-morta”, de Vinícius Jatobá).

Nomear os destaques, aliás, teria possivelmente relevância: “Noites de Alface”, de Vanessa Barbara, tem o melhor início, um parágrafo forte que termina com um definitivo “Desde então, a casa sem Ada é de gavetas vazias”.

Também impactantes são os textos de Emilio Fraia (“Temporada”), Cristhiano Aguiar (“Teresa”), Javier Arancibia Contreras (“A Febre do Rato”) e a carta do pai, de Leandro Sarmatz (“Você Tem Dado Notícias?”).

“Animais”, o conto de Michel Laub que abre o volume da “Granta”, é perturbador em seu inventário numerado de mortes de bichos e homens (“1. Quando eu tinha onze anos, em Porto Alegre, meu cachorro Champion foi morto pelo dobermann do vizinho.”), mas, como acontece tantas vezes na obra dele, é calculado demais, contido demais.

Há, enfim, várias alternativas. Esta é de fato uma resenha difícil.

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ADRIANO SCHWARTZ é da USP e autor de “O Abismo Invertido – Pessoa, Borges e a Inquietude do Romance em ‘O Ano da Morte de Ricardo Reis'” (ed. Globo).

GRANTA – os melhores jovens escritores brasileiros
AUTORES vários
EDITORA Alfaguara
QUANTO R$ 34,90 (288 págs.)
AVALIAÇÃO bom