Em “Roma”, como os romanos

Postado em: 20th junho 2010 por Vanessa Barbara em Crônicas, Folha de S. Paulo, TV
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Aqui em casa, somos patologicamente suscetíveis a séries de tevê. Os efeitos se mostram mais impactantes quanto mais distante está o seriado da nossa vida real – na época de “Família Soprano”, por exemplo, não demoramos mais que quinze minutos para aderir à Máfia.

Durante meses, tomamos Nescau batido na padaria enquanto discutíamos quem ia virar “capo” e quem ia virar presunto. Nunca foi tão descolado sair à porta de casa em pantufas para apanhar o jornal. Aliás, o episódio em que Bobby Bacala compra um trenzinho de brinquedo nos fez chorar aos soluços, tanto que foi preciso intercalar com um trecho de “Barney e Seus Amigos”, a título de calmante.

Recentemente, passamos a andar de capuz só por causa de outra série, “The Wire”, excelente drama policial que enfoca o tráfico de drogas num subúrbio de Baltimore. Agora, ao avistar um homem da lei dobrando a esquina, gritamos “Five-O!”, que é a gíria usada para se referir aos policiais (em homenagem a “Havaí 5.0”). Montar escutas telefônicas também não nos oferece mais nenhum mistério.

“The Wire”, aliás, tem o melhor final de série de todos os tempos. O caneco de melhor início vai para “Lost”, embora o episódio de abertura da sexta temporada de “House” nos tenha conduzido às lágrimas. A comoção doméstica foi ouvida até pelo porteiro do prédio vizinho, que passa a madrugada assistindo reprises de “Pica-Pau”.

“Monk” nos fez andar na rua encostando o dedo nos postes. Após nove temporadas de “Arquivo-X”, suspeitamos de uma conspiração em plena reunião de condomínio. “Millenium” foi a opção dos dias mais tristes, só porque era uma história trágica e nos dava a sensação de que “havia gente bem pior”. Em nossa fase “24 horas”, só se entrava na cozinha com um chute na porta, na ânsia de torturar os melhores donuts.

O efeito nem sempre é coerente com os propósitos da série: “Columbo” nos fez sentir muito espertos, ainda que amassados, confusos e meio vesgos. “Twin Peaks” nos deixou mais esquisitos. “Em Terapia” provocou silêncios amuados, angustiados, confusos. “Top Chef” deu alguma utilidade à cozinha, recinto menos prestigiado da casa.

Quero só ver quando começarmos “A Sete Palmos”.