Volta, “Walk Talk Show”

Postado em: 13th junho 2010 por Vanessa Barbara em Crônicas, Folha de S. Paulo, TV
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“Olá. Posso te conhecer?”, pergunta Robson de Andrade Gonçalves, entrevistador do extinto programa “Walk Talk Show” (TV USP). Com o microfone na mão, seu trabalho era abordar populares que passavam pelo campus da universidade, sem pauta e nem objetivo específico. “Oi. Tudo bom?”, ele insistia, e havia quem respondesse: “Não”.

Isso nunca foi motivo de constrangimento para Robson, codinome Rob Ashtoffen. O programa “que fala, fala, fala, e anda, anda, anda” durou duas temporadas e não tinha nem sombra de roteiro. Num episódio típico, o destemido repórter se aproximava de alguém e perguntava o que lhe desse na telha, seguindo ocasionais sugestões transmitidas via walkie-talkie pelo diretor do programa.

Só na conversa fiada, ele descobriu coisas extraordinárias como a biblioteca do centro acadêmico da USP–São Carlos, que abre inclusive aos domingos, quando “é só chamar ali no portão que eu abro”, segundo a encarregada. É a única instituição acadêmica a ter um cachorro residente, o Bob, e dois morcegos, o Maconha e o LSD, que veem tudo de ponta-cabeça. A bibliotecária-chefe aparece em fotos institucionais mostrando o dedo do meio. Foi ela quem, em 1983, causou tumulto no campus: “Peguei um carrinho de pedreiro, invadi o alojamento e recuperei os livros atrasados”, contou.

Robson costuma aparecer de forma inesperada e, diante da falta de assunto, pergunta coisas como: “Você pretende ter filhos?” ou “Você acha que a criação da sua mãe te influenciou a não ter sonhos?”, este último a um calouro da faculdade sem objetivos de vida. “Não estou me empenhando muito por nada”, o sujeito confessou.

A um professor de astronomia, papeou sobre manchas solares e questionou se o apocalipse estava próximo. A uma moça que pregava anúncios no mural, conseguiu extrair a constatação muito íntima de que “os meus cartazes são bem colados”. Sociabilizou com a moça do hot-dog, com um maluco local e com duas estátuas.

“Não sou um entrevistador, sou uma pessoa que conversa”, declarou. Para o rapaz, o ofício de entrevistar “é que nem boiar na água, né?”.

Robson, talvez o melhor entrevistador da TV, é um insólito estudante de biblioteconomia.