16/06/2008
Blog da CosacNaify

“Chegou! É um bebê tão bonito e amarelo e ele pia…
Gente, ficou lindo. É o livro mais vistoso desde Manual de refrigeração e ar condicionado (ed. Fulton, 1366 pp., com diagramas de câmaras frigoríficas). O papel, o “sujinho”, tudo ficou tão bonito que dá vontade de comer.
Obrigada! Vocês são demais. Vamos comemorar na plataforma de desembarque n. 82 com bala 7Belo e maisena.
Cubram-se de icterícia.
v.”
[E-mail escrito por Vanessa Barbara à equipe Cosac Naify: reação ao receber o bebê]

 

“ELA REALMENTE SÓ VIU O LIVRO QUANDO ESTAVA PRONTO. E ADOROU (UFA!)”

Elaine Ramos e Maria Carolina Sampaio comentam a criação do projeto gráfico de O livro amarelo do Terminal, original em forma e conteúdo

Talvez não fosse de se estranhar o desenho gráfico de O livro amarelo do Terminal, reportagem literária sobre a rodoviária do Tietê escrita por Vanessa Barbara, caso nele estivessem fotos de ônibus, rostos de transeuntes, imagens da época de sua construção, em 1982. Seria normal. Mas em absoluto representaria a singularidade narrativa criada pela autora, que opera com habilidade a mescla de estilos aliada a uma incrível profusão de vozes sensivelmente captadas.

Na entrevista a seguir, a diretora de arte da Cosac Naify Elaine Ramos e a designer Maria Carolina Sampaio detalham o projeto gráfico do livro, que recria em traço o texto de Vanessa Barbara.

 

A cor do nome, o nome da cor e os papéis

“Chegou-se ao título O livro amarelo do Terminal por conta do papel escolhido, que faz referência ao tipo usado em passagens de ônibus e em livros de “páginas amarelas”, em que as pessoas buscam informações.

 

 

Internamente, o livro é composto por três tipos de material: na maior parte do miolo, temos o papel amarelo de gramatura menor (APG); em um trecho mais curto, optamos também por um bloco de páginas de papel auto-copiativo, que leva carbono em sua composição, o que recupera a idéia do papel mimeografado (com o manuseio, ficam nele algumas leves manchinhas); por último, um papel roxo (MF), de maior gramatura. Para a capa, optamos por uma cartolina amarela laminada.”

Polifonia gráfica

“Os originais do livro nos chegaram com algumas indicações de onde o texto ganha novas formas, como por exemplo, a separação em colunas; uma nota musical indicando os trechos de canções; algumas palavras escritas em negrito, ou com letra maior. Buscamos, então, criar diferenciações consistentes que atendessem às especificidades do texto.

Praticamente todas as interferências adotadas no projeto gráfico vêm do universo da rodoviária: viagens, logotipos de empresas de viação, pintura dos ônibus, sinalização etc. Usamos também minha coleção pessoal de tíquetes de viagens [por coincidência, Elaine Ramos coleciona há anos bilhetes de viagens, entradas de museus, de eventos etc] e matérias de jornal coletadas pela autora. Mas é importante dizer que todas essas referências foram traduzidas graficamente, e não mimetizadas: evitamos reproduzir simplesmente as imagens ou informações gráficas. A partir daí, procuramos criar uma linguagem própria para o livro.”

 

 

Harmonia no caos

“O grande desafio foi achar uma visualidade que traduzisse a polifonia e a estranheza encontradas na narrativa. Na diagramação das páginas, optamos por um espaçamento maior entre as linhas, de forma que a frente não coincidisse com o verso: como o papel (amarelo) é muito transparente, vêem-se as linhas do verso, num movimento de trás pra frente.

Já na divisão geral dos capítulos, ou seja, no macro da edição, há uma organização muito clara. Combinamos formas geométricas, abstratas e racionais, com a sujeira e o acaso do xerox e da transparência. A soma das duas coisas resultou num contraste parecido com o da rodoviária: o caos da movimentação das pessoas, transeuntes em um arcabouço muito claro e funcional, próprio da arquitetura e da sinalização da rodoviária. Estas características dialogam com um dos traços mais fortes do livro: a diversidade de vozes narrativas, o choque entre as diferentes perspectivas, a vitalidade deste ambiente, que é a maior rodoviária do país; esta “cidade de coisas perdidas”, como escreve Vanessa. Se criássemos um projeto gráfico apenas organizado e competente, seria como ver a rodoviária vazia, sem ninguém.”